Sobre

Nossa história

Para além da nossa formação pessoal, nos preocupávamos com questões sociais importantes que, invariavelmente, tocam qualquer brasileiro. Afinal, a prática da psicanálise não pode ser dissociada do tempo e do espaço onde ela ocorre. O Brasil, profundamente desigual, violento e injusto, é nossa dimensão de espaço e tempo da qual não devemos nos desligar.

Nós tínhamos (e ainda temos) muitas questões: as pessoas conhecem a psicanálise? Como ela vem sendo divulgada? A psicanálise pode/deve ser mais acessível? O acesso se daria apenas por abaixamento do valor monetário das sessões? Este abaixamento do valor, trata-se de caridade? Qualquer pessoa pode ou deve fazer análise? A psicanálise é uma prática restrita aos consultórios e clínicas? É restrita a bairros de classe média alta? O que vem sendo feito sobre isso no meio psicanalítico em Ribeirão Preto? e no Brasil?

Quando parecia que avançávamos em algumas questões, novas surgiam. De nossas conversas e de uma ideia já implementada por um de nós em 2011, nasceu a Clínica Social de Psicanálise Hélio Pelegrino, no início de 2014.

Nossa proposta não é de uma Clínica de caridade ou de baixo custo, mas sim de possibilidades, em que o termo “social” vai balizar nosso desejo de estabelecer contatos e relações justas. Um espaço em que o desejo de fazer análise se encontra com a aposta nos potenciais humanos.

Reunião de Fundação da Clínica Social em 2014

I Encontro da Clínica, realizado em outubro de 2019


A Clinica Social de Psicanálise
É uma organização formada por profissionais e estudantes da psicanálise preocupados – para além de suas formações pessoais – com questões sociais importantes que tocam a psicanálise. A Clínica constitui-se seguindo princípios democráticos de gestão. O Grupo Gestor é composto de 3 membros que cuidam de aspectos administrativos e a Assembléia Geral é o conjunto de todos os membros que decide por voto qualquer questão importante.

Qual é o objetivo da Clínica Social de Psicanálise Hélio Pellegrino?
Nosso objetivo é reunir e manter um grupo de profissionais sensíveis às questões sociais que tocam a psicanálise, possibilitando assim o encontro entre aquele que busca e aquele que oferece o espaço analítico, espaço onde uma relação de parceria justa pode ser iniciada. Tal encontro só é possível se as pessoas souberem que existimos e o que fazemos, por isso, também é nosso objetivo divulgar a psicanálise, buscando aumentar a quantidade e a qualidade de informações sobre ela.

Quem são os profissionais do Grupo Gestor?
A Clínica Social passou por algumas mudanças e, no atual grupo gestor, existem tanto fundadores quanto outros profissionais do corpo clínico. Hoje o Grupo Gestor é responsável pelos aspectos funcionais e administrativos da CSP. É composto por 3 membros e se dissolve anualmente. Nos encontramos frequentemente e pensamos juntos como cuidar da divulgação, dos encaminhamentos, da seleções de profissionais e sobre outros aspectos da nossa formação.

Quem são os profissionais do Corpo Clínico?
São profissionais liberais que atendem em seus consultórios, em sua maioria psicólogos, que escolheram a psicanálise como abordagem de trabalho e que foram selecionados a partir de seu nível de comprometimento com a formação em psicanálise e da forma como pensam questões sociais a ela relacionadas. A formação em psicanálise é complexa e bastante controversa, mas é consenso que deve ser cuidadosamente construída com especial investimento em análise pessoal, supervisões clínicas e estudos teóricos, atividades estas que devem obrigatoriamente fazer parte da formação dos profissionais que selecionamos.

Por quê Hélio Pellegrino?

Hélio Pellegrino foi um psicanalista importante na história da psicanálise brasileira pelo seu envolvimento com a democratização do Brasil em épocas de ditadura militar e pelo seu comportamento extremamente crítico em relação aos sistemas de poder nada democráticos implantados dentro de seu grupo de formação em psicanálise (PIRES,1998). Hélio e Anna Katrin Kemper incomodados com a elitização da psicanálise no Rio de Janeiro da década de 70, de forma revolucionária para a época, fundaram a “Clínica Social de Psicanálise” que tinha a proposta de oferecer um “banco de horas” em que cada profissional ligado ao projeto depositava duas horas de atendimento por semana e os clientes pagavam quantias simbólicas pelos serviços. Embora nossa proposta tenha aproximações e diferenças com a proposta de Hélio Pellegrino, seu nome foi escolhido para homenagear a sua iniciativa radical e pioneira, e pelo fato de ter nos inspirado a pensar sistematicamente a questão do acesso à psicanálise.


Como pensamos o Social?
A palavra social tem vários significados e observamos que é usualmente atrelada à prática de ações filantrópicas que buscam ajudar financeiramente ou reintegrar os excluídos. Entendemos que nossa atuação é limitada e, por isso, esse não é o significado que desejamos atribuir ao “social” em nossa clínica. O social a que nos referimos é aquele que corresponde ao respeito à vida em sociedade, que organiza o encontro entre indivíduos que compartilham necessidades e desejos, sendo que, para alcançá-los, se submetem às leis comuns, acordos e contratos. Esperamos que estes acordos sejam justos e que possibilitem não só a sobrevivência, mas o desenvolvimento.

Por que o atendimento não é gratuito?
O atendimento psicanalítico é realizado segundo um acordo justo entre o analista e o futuro paciente.

As entrevistas iniciais são gratuitas?
Alguns profissionais preferem realizar o primeiro contato com o paciente de maneira gratuita, mas isso não constitui uma regra em nossa Clínica.

Existem outras propostas sociais em psicanálise?

O primeiro Instituto de Psicanálise ocupado com a formação de novos analistas era “social”. Em 1920, com a abertura do Instituto Psicanalítico de Berlin, Max Eitingon, ao mesmo tempo em que instituiu regras básicas para a formação analítica (análise pessoal, supervisão e estudo teórico) abriu a possibilidade de atendimento gratuitos ou com custos variáveis de acordo com as possibilidade dos pacientes (Roudinesco, 1998).

Muitos dispositivos sociais e institucionais, das mais variadas naturezas, sempre foram sustentados pelos psicanalistas interessados na democratização da psicanálise e no direito universal à saúde. A Policlínica Psicanalítica de Berlin de Abraham, os grupos terapêuticos e políticos sexpol de Reich, a ação continuada do analista, renovadora da própria psicanálise, no hospital público, de Winnicott, os grupos psicanalíticos de trabalho e operativos, de Bion, Pichon Rivière e Bleger, na Inglaterra e na Argentina, os grupos psicanalíticos e as instituições para trabalho com psicóticos, de Didier Anzieu, René Kaës, Felix Guattari e Maud Mannoni, os grupos Balint em hospitais, as clínicas psicossociais dos psicanalistas cariocas brasileiros, e o próprio impacto da psicanálise e dos psicanalistas nos Capes de Saúde Mental, o resultado maduro da política antimanicomial brasileira, são apenas alguns entre tantos trabalhos desta natureza que atravessam a história da psicanálise e que hoje existem em Universidades, Institutos de Formação e Instituições (Ab’Sáber, 2016).


O que Freud pensaria disso?
Freud (1919) já abria caminho para que a psicanálise se espraiasse para além do consultório particular e que o tratamento psicanalítico, longo e caro, pudesse sofrer variação de maneira a atender necessidades de um maior número de pessoas, segundo ele próprio, “para as amplas camadas populares, que tanto sofrem com as neuroses”. Em instituições públicas ou privadas, Freud previu um atendimento gratuito realizado por profissionais com formação psicanalítica. Imaginamos que ele apoiaria iniciativas que buscassem acolher demandas de análise sem, no entanto, perder de vista o risco do uso da questão financeira como ferramenta para resistência ao desenvolvimento do trabalho.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AB’SÁBER, Tales. Psicanálise, espaço público e vida popular. Julho de 2016. Disponível em <http://vilaitororo.org.br/em-obras/clinica-publica-de-psicanalise/psicanalise-espacopublico-e-vidapopular/> Acessado em: 8 mai 2017

FREUD, Sigmund. Caminhos da terapia psicanalítica, Obras Completas, vol. 14, Companhia das Letras, 1919.

PIRES, Paulo Roberto (1998). Hélio Pellegrino – A paixão indignada. Relume-Dumará, p.84-86.

ROUDINESCO, Elisabeth e PLON, Michel. Dicionário de psicanálise. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998.